Estimados Ilhavenses,
Vivemos um mundo novo. Um estranho mundo novo.
As nossas rotinas e passatempos, o nosso ganha-pão e até os nossos gestos estão condicionados e reféns de um inimigo silencioso e invisível. A primavera chegou e não trouxe a folia e o convívio de que era sinónimo. As ruas vestem-se de nada e não é difícil encontrá-las vazias. O canto dos pássaros nunca foi tão audível, mas no silêncio não são os únicos que ressoam, pois por todo o lado se ouvem uivos de medo e sofrimento.
O nosso concelho não escapou ao flagelo e muitos são os que choram pela perda dos seus parentes, dos seus amigos, dos seus conhecidos. Numa cidade pequena, onde os corações são grandes, quase todos se conhecem e partilham o sufoco e a dor dos que perecem e dos que padecem. É o nosso luto coletivo, um luto por aqueles que partem mais cedo, seja por um dia, por um mês ou por um ano. Partem em hora ingrata e deixam não somente a saudade que já conhecíamos, mas um sentimento de impotência, tantas vezes de culpa, por tudo o que gostávamos de ter previsto ou de ter feito melhor.
Mas permitam-me acreditar – e dar-vos a acreditar – numa velha frase de Voltaire:
“Tudo vai pelo melhor no melhor dos mundos possíveis”.
E é esta a minha convicção. No meio da tragédia, encontrei uma certeza: vivo no melhor país do mundo. Nunca o nosso povo se provou tão solidário, nunca as nossas gentes se provaram tão cautelosas e nunca os nossos políticos se demonstraram tão responsáveis.
Com uma história política conturbada, Portugal dá sinais inequívocos de uma democracia matura. Uma democracia que foi capaz de responder a um apelo: união. Estamos todos unidos. Unidos nessa missão de fazer o melhor neste mundo possível. Nada vai perfeito e certamente não há motivo de festejo, mas esta é uma improvável vitória coletiva.
Na celebração do nosso feriado municipal e desde que fui eleito que repito um discurso que para muitos é ingénuo: um apelo à união. Um discurso que rejeita a politiquice e o sobrepartidarismo, um discurso que convoca ao debate político com um único propósito: o melhor para os nossos.
Pedi que as bancadas se mantivessem firmes nos seus ideais, mas brandas nas suas intolerâncias, capazes de colher o melhor de cada contributo. Esta súplica já não é uma miragem, é agora uma certeza. Uma certeza de que juntos vencemos e venceremos. E para que o centenário do nascimento de um dos nossos – Mário Sacramento – não fique esquecido, deixo um outro apelo, não meu, mas do próprio, na sua carta-testamento:
“Façam o mundo melhor, ouviram! Não me façam voltar cá!”
Uma Santa Páscoa.