Recordar Carlos Paião por altura da efeméride do seu falecimento, continua a constituir, para nós, um acto de amizade e solidariedade para com sua família, leia-se, seus Pais, que muito estimamos e de quem sabemos nos entendem este “recordar” como forma de manter viva a memória de uma das figuras ilhavenses que continua a ter um lugar muito próprio no coração desta comunidade.
Assim, recorremos à colectânea dos V Jogos florais deste Jornal para lembrarmos a triste data sim, mas, essencialmente, para honrarmos a memória daquele que se mantém “vivo” na nossa memória colectiva…
30 anos de vida
Carlos Manuel de Marques Paião nasceu no dia 01 de novembro de 1957 na cidade de Coimbra, onde a assistência médica era melhor do que na, então, vila de Ílhavo.
Mas era um Ilhavense porque toda a sua família é de Ílhavo, a começar pelos seus Pais.
Se dúvidas houvesse bastaria ouvir as expressões e palavras típicas da nossa terra que ele usou em algumas das suas canções.
Em 1962 começou a aprender a tocar acordeão e em 1978 tinha mais de 200 canções escritas.
Estreou-se no “mundo das cantigas” em 1978 no Festival da Canção do Illiabum Clube de Ílhavo onde conquistou dois prémios, sendo um deles o de melhor intérprete.
Em 1980 trocou, definitivamente, o Curso de Medicina que frequentava em Lisboa pela carreira musical.
E logo no ano seguinte ganhou o Festival RTP da Canção representando Portugal no Eurofestival da Canção realizado, nesse ano, em Dublin, na República da Irlanda. A canção era o conhecidíssimo “Play-back”, uma sátira aos cantores que enganam o público cantando em play-back.
Compositor, intérprete, instrumentista e produtor foi como letrista que o seu nome ganhou maior dimensão escrevendo para vários artistas, inclusive para Amália Rodrigues.
Entre as muitas canções que escreveu e cantou todos se recordam de “Cinderela”, “Pó-de-arroz”, “Vinho do Porto”, “Marcha do Pião das Nicas”, “Souvenir de Portugal”, “Eu não sou poeta”, “Versos de Amor”, “Lá longe Senhora” e tantas outras em que brincava com as palavras descobrindo-lhes a beleza e poesia.
30 anos depois
Carlos Paião faleceu no dia 26 de agosto de 1988, vitimado pela aparelhagem e colunas de som que transportava no carro, quando este teve um acidente de viação.
Tinha estado em casa nos dois dias antes, o que era muito raro, sobretudo tendo em conta que agosto era o mês mais forte de concertos, muito devido ao regresso dos emigrantes, para férias. Faziam uma média de 60 espectáculos por ano, chegaram a ter quase 30 espectáculos neste mês.
A meio da manhã dessa sexta-feira, Carlos Paião, ainda com 30 anos, arrancou de casa, em São Domingos de Rana, com a mulher, Zaida e o cocker Yazamuri, até Caxias, onde vivia o amigo e técnico de som, Jorge Esteves. Depois de apanharem também Carlos Miguel Sousa, puseram-se a caminho. A condução era alternada entre Jorge Esteves e Carlos Paião.
Os óbitos de Carlos Paião e de Carlos Miguel Sousa foram declarados ainda na Estrada Nacional 1, na zona de Rio Maior, por volta das 15h. Jorge Esteves foi transportado para o Hospital S. José, em Lisboa, com fraturas no pé, que perduraram, mas só dois dias depois teve conhecimento de que os amigos tinham falecido.
Durante estes 30 anos, foram várias, as homenagens e oportunidades para recordar o artista ilhavense. Recentemente, na edição de 2018 do Festival do Bacalhau, a fadista Andreia Alferes, a cantora Vanessa Oliveira e o cantor Ricardo Fino, juntaram-se a músicos da Filarmónica Gafanhense e da Banda dos Bombeiros Voluntários de Ílhavo para homenagear Carlos Paião.
Assim recordamos, com muita saudade, amizade e amor este grande Ilhavense que continua “vivo” na memória deste povo da Terra Maruja que não o esquece.
Torrão Sacramento
A jornalista e investigadora Joana Martins, analisou, na sua tese de doutoramento “A morte na imprensa: a evolução no tratamento mediático da morte de figuras públicas”, as notícias da morte de Carlos Paião, veiculadas no Jornal de Notícias, Diário de Notícias e Correio da Manhã, no dia após a sua morte, primeiro mês, os primeiros seis meses, o primeiro ano, os primeiros dez anos e os primeiros vinte anos após a sua morte. A investigadora concluiu que apenas o Correio da Manhã publicou uma notícia a recordar a sua carreira no primeiro aniversário de morte. Nenhuma das outras efemérides foi recordada em nenhum dos jornais.
A um website, a autora disse: “uma das maiores surpresas…foi quando percebi que os jornais quase não tinham falado da morte do Carlos Paião e também percebi rapidamente porquê: o Chiado estava a arder, ainda. Tinha sido o grande incêndio do Chiado um dia ou dois antes e estávamos no meio de agosto. Talvez se o incêndio não tivesse acontecido a cobertura da morte do Carlos Paião tivesse sido bastante mais extensa e comparável até com a de outras figuras públicas”, continuou.