Nisto de falarmos da juventude, corremos facilmente o risco de provocar uma divisão bacoca entre datas de nascimento que nos levam a catalogar uns de jovens e outros de velhos. A ideia de juventude tem de ser mais interessante do que o número que a descreve: os clichés existem, muitas vezes, por serem verdadeiros e, de facto, “a idade é só um número”.
Existem jovens que ainda não atingiram a maioridade e já toda a juventude se lhes esgotou. Haveria muito a dizer sobre isso e sobre o porquê disso – uma escola empenhada num atletismo intelectual inimigo da formação de uma consciência crítica? Uma ideologia neoliberal que resume a vida a uma busca incessante de poder de compra? Talvez um pouco mais do que isso -, porque a juventude é, acredito, uma característica que podemos levar pela vida fora.
É o ato de constante inquietação, constante renascimento e de constante abertura ao novo que deve definir essa juventude, se queremos que a palavra possua realmente algum valor. Por isso, Elis Regina (cantando Belchior) nos dizia: “minha dor é perceber que apesar de termos feito tudo o que fizemos, ainda somos os mesmos e vivemos como os nossos pais”. É sermos sempre os mesmos que faz de nós velhos, enquanto pessoas e enquanto grupos de pessoas.
Ocorre-me isto ao ver as fotografias dos nossos velhos do projeto Maiores Idade na primeira marcha LGBTI+ contra a homofobia em Aveiro, numa manifestação exemplar de amor à liberdade e de empenho na cidadania.
E, neste caso, a idade é relevante. Esta foi a geração que sofreu a maior violência da homofobia institucionalizada e da repressão sexual e de género. Se hoje ainda não se encontram plenamente cumpridos na lei os direitos de pessoas LGBTI+, imagine-se que, para uma pessoa de 80 anos, durante mais de metade da sua vida a homossexualidade foi um crime punível por lei. E a lei é o mais fácil de mudar, comparativamente a um lastro de ultraconservadorismo católico promovido ao longo de grande parte do século XX.
Foram, logicamente, as vítimas diretas – as comunidades LGBTI+ – quem sofreu e sofre a grande indignidade com esta discriminação. Mas sofre toda uma sociedade pelo obscurantismo e pela falta de liberdade, pelo tratamento indigno dos seus próximos, dos seus familiares, dos seus concidadãos. Pela sua própria amarra a noções idiotas de virilidade.
No entanto, esta é uma luta que a sociedade ainda não tomou completamente como sua e sobre a qual opta muitas vezes por assobiar para o lado.
Mas em Ílhavo há velhos que, nascidos neste Portugal cinzento, hoje saem para a rua sem receio e tomam nas suas mãos uma luta de que tantos jovens ainda se demitem. Uma luta que é pela liberdade – a sua, a dos seus filhos, a dos seus netos. Ao invés de um envelhecimento ativo, estes cidadãos mostraram-me um conceito mais importante ainda, o de um rejuvenescimento ativista, e estou-lhes grato por isso. Por vezes, conseguimos mesmo libertar-nos da História e perceber que já não somos os mesmos e não vivemos como os nossos pais. Como é belo olhar um grupo de velhos e ver o futuro.
A juventude, neles, será eterna.