«“A verdadeira vida está ausente”. Mas nós estamos no mundo.»
(E. Lévinas, a partir de A. Rimbaud)

Quando Armando Pimentel se tornou membro de uma das famílias operárias da Fábrica da Vista Alegre, os “artesãos, artistas, artífices”, saberia, por certo, que passava a pertencer ao grupo dos operários altamente qualificados do séc. XIX e XX, em Portugal. Diz quem o conheceu, que a vida do Mestre Armando Pimentel é um testemunho contemporâneo desta classe operária.

“É nomeado Encarregado da Aula de Pintura o Sr. Armando Oliveira Pimentel. […] A Aula de Pintura, destinada à preparação intensiva de pintores e decoradores a partir dos alunos da Aula de Desenho” (Ordem de Administração nº 2439, 1 de Janeiro de 1967)

Do Mestre, sabe-se que se diferenciou pela sua formação, experiência, inteligência, conhecimento exato dos processos, relações e recursos de produção, por sentir satisfação de aprender e de inovar os processos e os produtos, pela vontade de ter mais responsabilidade e de dominar a “arte”, por querer mais autonomia e, com isto, não ser tratado apenas como “braços e pernas”, mas também como criativos e inovadores.

“Por se reconhecer nele muita habilidade, passou a trabalhar directamente com o professor da aula o aprendiz Armando Pimentel, que regressou novamente da oficina para a aula passando simultaneamente de empreitada para jornal” (Relatório da Fábrica da Vista Alegre, 1949)

Do Mestre, conta-se que trabalhava junto com os outros, vivia empenhado num trabalho comum que responsabiliza todos, apoiando os percursos educativos coletivos e experienciais no contexto fabril – os quais eram complementados pela educação moral e cultural das instituições operárias da Fábrica ou outras (associações corporativistas ou culturais, sindicatos).

“O pássaro azul da china partia com uma facilidade danada porque só estava pousado com as patas. Uma vez o Armando Pimentel pediu ao Ti Silvério para pintar um pássaro desses, e quando ele chegou à mesa, pousou e, ao arrastar, partiu o pássaro. O Armando Pimentel disse, ‘vai lá buscar outro, vai lá buscar outro’. Partiu três seguidos. Ao fim do terceiro, já o mandou fazer outra coisa, pois os nervos já não o deixavam pousar aquele pássaro” (Diário Etnográfico, 5/05/2011)

Do Mestre, ouve-se que já só pintava para os seus próximos e pelo prazer de fazer “arte”, afastando-se das relações instrumentais e racionais com o trabalho e a produção artística, para manter viva a identidade e cultura dos artesãos, artistas e artífices e, com isso, as obras e as memórias que permitem conhecer a história social contemporânea da Fábrica da Vista Alegre e do operariado português.

Quando Armando Pimentel se tornou artesão, artista, artífice da Fábrica da Vista Alegre, não saberia que se tornaria o seu último Mestre! Mas nós sabemos!

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