AFONSO RÉ LAU

Todos os meses, o 23 Milhas e a Talkie-walkie – empresa portuense responsável pela organização de visitas de divulgação da arte e da arquitetura – propõem visitas a edifícios, lugares ou obras no concelho de Ílhavo, guiadas por um especialista convidado.

A mais recente sessão deste ciclo “Olhar por Dentro” realizou-se no dia 25 de janeiro e foi orientada pelos irmãos Ricardo e Sofia Senos, do atelier M2Senos. A dupla de arquitetos ilhavenses já tinha conduzido outras visitas do género, nomeadamente, ao escritório onde desenvolvem os seus projetos e ao famoso edifício das casas de banho do cemitério de Ílhavo, do qual são autores. Apesar disso, Sofia admite que esta última visita “superou as expectativas”. “Tivemos a sessão esgotada e, além disso, os participantes pareciam verdadeiramente entusiasmados. Procuravam-nos e faziam muitas perguntas”. As questões eram quase sempre no sentido de perceber as opções dos arquitetos quanto à escolha dos materiais, formas ou cores, para uma explicação quanto às soluções de revestimentos ou ventilação dos espaços e ainda um ou outro esclarecimento quanto aos principais desafios que cada terreno acarretou.

É comum participarem nestas visitas de exploração do território estudantes ou profissionais ligados às áreas da arquitetura, da história, do design ou do património. No entanto, desta vez, o grupo que Ricardo e Sofia orientaram era bastante heterogéneo. “Senti que havia ali pessoas simplesmente curiosas, com vontade de saber mais sobre as casas, de conhecer o nosso trabalho e perceber o processo”, repara Sofia Senos. Esse processo, que começa com uma primeira reunião em que o cliente apresenta o “problema” e termina aquando da conclusão da obra, demora, “pelo menos, dois anos”. Uma jornada longa que atravessa uma fase prévia, em que os arquitetos procuram projetar soluções para o tal “problema”, isto é, encontrar respostas para as necessidades que a vivência naquele local vai implicar; que passa por uma fase burocrática de licenciamentos e autorizações; a terceira fase corresponde à execução detalhada do projeto e, por último, a derradeira etapa é dedicada ao acompanhamento da obra. 

Casa IF e Casa da Amélia são alguns dos projetos de habitação unifamiliar que os dois jovens arquitetos têm vindo a projetar e construir em Ílhavo. Neste “Olhar por Dentro”, visitou-se a Casa IF, na Rua Conselheiro António José da Rocha, uma habitação que tem a particularidade de estar num terreno triangular, e ainda uma moradia em construção na rua das Cancelas. Sofia não esconde a “responsabilidade acrescida” de projetar para Ílhavo. “Quando estamos a intervir no nosso território, com o qual temos uma ligação forte, questionamo-nos ainda mais vezes se estamos a fazer tudo bem”, assegura. 

Atualmente, o atelier M2Senos tem em mãos a nova cozinha e lavandaria social do Lar Residencial do CASCI, bem como projetos de reabilitação e construção na Costa Nova, zona que Sofia elege como “prioridade” no que diz respeito à intervenção arquitetónica no município. “Há outros locais com potencialidade turística em Ílhavo, mas nenhum como a Costa Nova”, refere a arquiteta para quem “a atenção dada ao espaço público na Costa Nova ainda está aquém das expectativas”. 

Quanto ao centro da cidade de Ílhavo, que tem sido alvo de alguma atenção mediática nos últimos meses, Sofia considera que “Ílhavo nem sempre tem sabido aproveitar o património que tem”. António Sarrico dos Santos, autor da Casa Lavado Corujo (o “porta-aviões”), na Avenida Mário Sacramento, e do antigo mercado (onde hoje está localizada a Casa da Cultura), Ângelo Ramalheira, autor do antigo estádio (hoje, Pavilhão Municipal Capitão Adriano Nordeste) e do parque infantil contíguo, Belém Lima, autor do edifício do Café Jardim, na Calçada Carlos Paião, ou Samuel Quininha, que desenhou a Garagem Cruz na mesma calçada, são alguns dos arquitetos e engenheiros a quem, na visão de Sofia Senos, “devemos alguma da qualidade que ainda existe no centro” de Ílhavo. A arquiteta lamenta, por isso, que algumas dessas memórias tenham sido “apagadas” e considera que, “enquanto herdeiros desse património, [os ilhavenses] não devem ter medo de o reconhecer e valorizar”. Sofia faz ainda questão de recordar como bom exemplo a obra de qualificação urbana do casco antigo da cidade no âmbito do projeto RUCHI – Regeneração Urbana do Centro Histórico de Ílhavo -, concluído em 2013.

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