Mesmo que não tenhamos consciência disso, a música existe na Terra há tanto tempo como os seres humanos e os seus primeiros instrumentos musicais foram as cordas vocais e as bases naturais da precursão (madeiras, rochas, peles). Por isso, a evolução da música foi (e é) tão dramática como a evolução dos próprios seres humanos. Da erudita passando pelo jazzblues (inspirado nos ritmos africanos), gospel, funk, bossa nova, samba e rock and roll, a música sempre veio dos pensamentos e experiências mais profundas dos seres humanos: as críticas sociais, os rituais (música persa ou indiana), o amor, a boémia, a depressão… Em suma, o não estar bem ou o estar demasiado bem.

Infelizmente, o avanço da tecnologia e a digitalização tiveram um impacto negativo nos sentimentos que inspiram a música, que passaram a ser mais quadrados. Hoje, é frequente ver que muitos jovens – mas não só – preferem consumir música tóxica, sem conteúdo construtivo, imaginário harmónico, melódico e emocional… Música que antes de o ser tem de se submeter a uma limpeza que lhe tira a sua pureza e genuinidade através de ferramentas como o autotune ou o copy-paste de secções.

Mas não é só a tecnologia que influencia o gosto musical, gosto ou mesmo apreciação e compreensão artística dos jovens. A educação artística e cultural das escolas e das famílias também afeta este gosto. Como é possível que os jovens ardam de desejo para ir ver um concerto a um estádio e não sabem que esse desejo foi incendiado, lá atrás, com os Beatles (pois foram eles que começaram a tocar em estádios) e a beatlemania? Como é possível nem sequer conhecerem os Beatle e a beatlemania?

Onde encontramos a cultura musical? Na rádio? No pop? Apesar de controverso e discutível, eu defendo que todos os jovens deviam conhecer a suas raízes musicais. Como é possível que as pessoas não conheçam Chopin, Tárrega, Villa-Lobos, Charlie Parker, Miles Davis, Chet Baker, Jobim, Vinícius de Moraes, Ravi Shankar ou mesmo músicos do nosso país como Rão Kyao e Carlos Paredes, por exemplo?

Há quem diga que o problema está na falta de acesso à informação, mas, na minha opinião, também é o desinteresse generalizado pela cultura e, sobretudo, a pressa de aceder a um determinado conteúdo, ou seja, uma cultura de fast food também na música.

A agravar a situação, os espaços com música ao vivo estão em extinção, o consumo da música é cada vez mais digital – impulsionado por plataformas digitais que pagam muito mal aos criadores de conteúdo – e, sobretudo, a profissão de músico é, apenas e só, difícil (principalmente para os músicos com projetos independentes). Sobre isto, quero ainda criticar quem acha que ser músico é um hobby.

Tudo isto me leva a fazer um apelo: Vamos preocupar-nos com as coisas sérias da nossa cultura musical. Falo da cultura musical por ser aquela em que estou mais envolvido, como músico, como estudante, como melómano. Porém, o apelo estende-se a toda a cultura e, sobretudo, à relação que a minha geração tem com as questões culturais.

Vamos mudar o que há de errado na nossa sociedade!

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