A 4 de outubro, o clube AGE do Agrupamento de Escolas de Ílhavo assinalou o Dia Mundial do Animal com uma palestra sobre “bem-estar animal”. O auditório do Museu Marítimo de Ílhavo acolheu 111 alunos do 8º ano de escolaridade numa aula diferente com o médico veterinário Marcelo Santos, da “Planeta Animal”, clínica veterinária de Esgueira.
O objetivo da palestra foi “refletir sobre o sentido dos animais nas nossas vidas” e “despertar novas consciências”, sem impor desígnios fundamentalistas. “A ideia não é que [os alunos] saiam daqui vegetarianos ou vegans, mas sim informá-los e estimular-lhes o espírito crítico para que possam passar a mensagem em casa e, daqui a alguns anos, quando a tomada de decisões passar por eles, estejam melhor preparados”, explica Marcelo Santos.
Na opinião do palestrante, é justo afirmar-se que, enquanto sociedade, “tratamos os animais muito melhor do que tratávamos há 50 anos e daqui a 50 anos vamos tratar ainda melhor do que tratamos hoje”. Com três décadas de profissão, Marcelo Santos não adere às visões radicais da atualidade, preferindo um caráter mais “low profile”, acreditando que “a sociedade leva o seu tempo a evoluir” e que “as práticas erradas vão morrendo naturalmente e o que é certo vai aparecendo”.
À pergunta “O que é preciso para um animal estar bem?”, Marcelo Santos responde com outra questão: “O que é preciso para um ser humano estar bem?”, sugerindo que estas realidades – o bem-estar animal e o bem-estar humano – não são assim tão distintas.
No que diz respeito ao bem-estar animal há um conjunto de aspetos que estão sob o controlo do ser humano e que são conhecidos como as “Cinco Liberdades”. Desenvolvidas nos anos de 1970, pelo britânico Roger Brambell, e adotadas pela comunidade científica desde então, estas “Cinco Liberdades” funcionam como um código de conduta. Estabelecem que, para um animal estar bem, deve estar livre “de fome e sede, de desconforto, de dor, doença ou injúria, de medo e stress”, bem como “ter a liberdade de expressar o comportamento natural da sua espécie”.
Isto leva-nos a ponderar sobre os contornos de medidas como a esterilização de animais levadas a cabo por vários municípios para controlo de população e garante da saúde pública e segurança dos cidadãos. Marcelo Santos explica que, vista à luz do bem-estar animal, é a opção pela não-esterilização que é tida como um mau-trato. “Fazer uma cadela passar pelo cio impedindo-a de copular já é considerado pela comunidade científica um mau-trato”. Marcelo defende, por isso, que todos os animais que não têm interesse reprodutivo devem ser esterilizados.
Em matéria de bem-estar animal, o tal “despertar de consciências” que esta palestra visava não começa obrigatoriamente com uma mudança de comportamentos, mas sim com a evolução da forma como, em sociedade, se pensa esta temática. E essa consciência coletiva expressa-se até na linguagem. Terminologias que sugiram posse, por exemplo, são “cada vez mais desaconselhadas”, uma vez que insinuam a subjugação de outro ser. “Os termos ‘proprietário’ ou ‘dono’ [de uma animal] já não fazem sentido. ‘Tutor’ ou ‘cuidador’ são melhores designações”, entende o médico veterinário.
“Educar para a cidadania”
A ideia de realizar esta palestra partiu do facto de o bem-estar animal ser uma das matérias do programa de estudos da nova disciplina “Cidadania e Desenvolvimento” e da vontade de Anabela Pinto Ribeiro, professora de Português e, ela própria, uma defensora da causa animal. Para a professora, “a escola não serve só para os meninos estarem a aprender a matemática, o português e as ciências”. No Agrupamento de Escolas de Ílhavo, garante, “queremos, cada vez mais, formar cidadãos dignos, conscientes e responsáveis”.
Trabalhar para esta “formação integral dos alunos”, bem como “educar para a cidadania”, “desenvolver uma cultura democrática” e proporcionar aos alunos “aprendizagens com impacto na atitude cívica e no relacionamento social” são os principais objetivos da nova disciplina “Cidadania e Desenvolvimento”. Introduzida no âmbito da mais recente reforma curricular levada a cabo pelo Ministério da Educação, esta disciplina promete versar temas como os direitos humanos, a igualdade de género e a educação ambiental, assim como as instituições de participação democrática, a literacia financeira, a segurança rodoviária e, como já vimos, o bem-estar animal.
No fim da sessão, João Campolargo saudou o Agrupamento de Escolas de Ílhavo pela iniciativa e Marcelo Santos pela partilha esclarecedora. Para além da sua experiência pessoal, o presidente da Junta de Freguesia de São Salvador partilhou a história de “Junta” e “Chaminé”, dois cães que apareceram nos armazéns e que foram recolhidos e adotados pelos funcionários daquela autarquia. “Os animais vivem intensamente os sentimentos e as emoções e são parceiros indispensáveis para o nosso crescimento”, concluiu o autarca.