AFONSO RÉ LAU

O Festival Gastronomia de Bordo é uma trilogia de eventos – o primeiro aconteceu em Peniche, de 18 a 20 de outubro; neste momento, está em curso em 19 restaurantes um pouco por todo o concelho de Ílhavo; e ainda haverá um terceiro momento, na Murtosa, de 27 de novembro a 1 de dezembro.

No que ao município de Ílhavo diz respeito, a edição de 2019 arrancou na antiga cozinha do Navio-museu Santo André, onde a chef Patrícia Borges, responsável pela curadoria do festival, preparou uma série de “tapas” de bacalhau, onde os sabores mais tradicionais surgiram reinterpretandos com ingredientes e técnicas contemporâneas. Fernando Caçoilo, presidente da Câmara Municipal de Ílhavo, recebeu e brindou com as cerca de duas dezenas de pessoas que a eles se juntaram neste momento de convívio e degustação.

Quem também participou nesta visita ao navio foi José Gomes Ribeiro, antigo cozinheiro da pesca do bacalhau. José passou mais de quarenta anos no mar, a maior parte deles na cozinha dos navios.

Hoje, com 73 anos, acha curioso o facto de a chora – uma sopa feita com cebola e cabeças de bacalhau – ser uma iguaria tão apreciada. “A bordo ninguém gostava, comiam porque era quente e não havia mais nada”, recorda. Nos navios, não era raro os cozinheiros serem respeitados pelos oficiais, mas terem mau nome junto da tripulação. “A alimentação era má, sim, mas a culpa não era só do cozinheiro. Era do capitão e do armador, que nunca queriam armazenar muitos alimentos”. Se assim foi nas primeiras viagens de José, depois do 25 de abril o cenário altera-se: passaram a fazer-se – porque era isso que determinava os contratos – quatro refeições por dia: “sopa, peixe, carne, às quintas e aos domingos, havia doce” e a fartura de alimentos a bordo passou a ser tanta que “as pessoas tornaram-se esquisitas”, relata.

Fruto de uma experiência de longos anos a tomar conta dos tachos nos navios bacalhoeiros, José foi convidado para colaborar com o Festival Gastronomia de Bordo, para partilhar a sua experiência, contar as histórias que viveu e (quem sabe?) cozinhar qualquer coisa.

Cada município participante no Festival Gastronomia de Bordo – Peniche, Ílhavo e Murtosa – escolheu uma referência gastronómica local que estivesse ligada à pesca e à comida confecionada a bordo das embarcações. Em Ílhavo, como não podia deixar se ser, o protagonista é o bacalhau e todos os seus derivados e as memórias são as da faina maior nos mares gelados da Terra Nova e da Gronelândia.

“Sentidos de Mar”, com propostas para lá da mesa

A par das propostas e experiências gastronómicas preparadas pelos chefs dos restaurantes ilhavenses, o festival tem também uma programação complementar, um conjunto de percursos orientadas (a pé, de bicicleta ou de moliceiro) e visitas guiadas a locais marcantes para a cultura de mar das gentes de Ílhavo. No próximo dia 16 de novembro, sábado, a partir das 10 horas, realiza-se uma visita orientada à Bacalhau Barents, empresa de transformação alimentar de bacalhau, que inclui também uma degustação pelo chef Ricardo Marques e uma visita ao Porto Bacalhoeiro. No domingo, dia 17 de novembro, também às 10 horas, propõem-se uma visita à Algaplus, uma unidade local de produção de macroalgas e uma visita ao cais da Malhada.

À mesa, em conversa com os participantes desta degustação, Fernando Caçoilo aproveitou para dar nota de um investimento de cerca de 600 mil euros, já aprovado, que vai permitir a requalificação do Navio-museu Santo André. O navio deverá ir para doca já no mês de janeiro, onde vai sofrer uma intervenção que pretende “colocar as coisas no sítio”, “melhorar o que pode ser melhorado” e “corrigir os problemas que têm surgido”. No verão de 2020, espera-se ter um Navio-museu renovado e com novos conteúdos expositivos para os visitantes.

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