AFONSO RÉ LAU

Faleceu ontem, dia 14 de abril, uma mulher de 85 anos residente no Lar de São José, em Ílhavo, infetada com o novo coronavírus. Com esta vítima, eleva-se para dez o número de mortes associadas à Covid-19 naquela instituição, “uma machadada muito grande na moral já fragilizada destas pessoas [utentes, familiares e colaboradores do lar]”, afirma Paulo Edgar, responsável pela gestão do Património dos Pobres da Paróquia de Ílhavo. 

À hora de fecho desta edição, o número de idosos infetados com o coronavírus em isolamento nas instalações do Lar de São José cifrava-se em 28, sendo que outros quatro utentes se encontravam internados no Hospital Infante D. Pedro, em Aveiro. 

Recorde-se que a primeira vítima mortal do Lar de São José foi uma mulher de 85 anos que morreu, na madrugada de 31 de março, depois de ter sido transportada para o Hospital de Aveiro onde lhe foi diagnosticado Covid-19. Este caso lançou o alerta não só na instituição, mas em todo o município. No dia seguinte, 1 de abril, perante o impasse causado pela falta das zaragatoas necessárias ao rastreio do coronavírus nos centros de saúde e unidades de saúde familiar, Fernando Caçoilo apelou diretamente à ministra da Saúde, Marta Temido, para uma ação “rápida e urgente” de forma a levar a cabo todos os testes necessários, “procurando evitar que a doença alastre e procurando salvar vidas”.

Ainda assim, acabou por ser Elsa Rocha, médica do Lar de São José, em colaboração com o Hospital de Aveiro, a desbloquear a falta de materiais para testar utentes e funcionários. 

Os 12 utentes que testaram negativo, foram transferidos, logo no dia 4 de abril, para a antiga Residencial Galera, onde estão a ser acompanhados por três colaboradores do Lar e por uma rede de 15 voluntários que assegura o apoio em três horários por dia. A Câmara Municipal de Ílhavo equipou o lugar com camas e uma televisão e encarregou-se da limpeza e da verificação das ligações de água, eletricidade e aquecimento para os quartos.

Equipas curtas, novas rotinas

No final da semana passada, o Património dos Pobres e a Câmara Municipal lançavam um apelo urgente ao recrutamento de enfermeiros que tivessem disponibilidade imediata para o exercício de funções no Lar. Menos de uma semana depois, informa Paulo Edgar, a equipa de enfermagem “já está mais composta”, com a contratação de três novos profissionais. O mesmo não se pode dizer dos auxiliares de ação direta – os cuidadores – em que a equipa é muito reduzida. No Lar, o acompanhamento dos utentes está a cargo de 9 funcionários que, com Luís Oliveira, diretor técnico da instituição, também se encontram em isolamento naquela residência. Paulo Edgar prevê que, nos próximos dias, e depois de duas semanas de quarentena, alguns colaboradores possam estar em condições de voltar ao trabalho e reforçar esta equipa de cuidadores.

A diminuição do número de auxiliares disponíveis para o acompanhamento dos utentes tem tido repercussões nas rotinas dos idosos. “Temo-nos limitado ao básico: cuidados de saúde e cuidados de higiene. Não temos tido disponibilidade para promover aquelas rotinas habituais ligadas à atividade física dos utentes, como incentivá-los a levantarem-se ou a fazerem pequenas caminhadas, bem como atividades de animação”, lamenta Paulo Edgar que admite que estas atividades de estímulo físico, social ou intelectual, são muito importantes para a qualidade de vida dos seniores e que, com a sua supressão, “tem-se notado uma regressão”. 

O Lar de São José é um local de afetos em que, numa situação de normalidade, a interação entre cuidadores e utentes é assídua e evidente. Na atual conjuntura, contudo, as medidas de contingência impuseram várias restrições neste âmbito – “por via da doença, não há beijinhos nem abraços” -, porém, assegura Edgar, “os cuidadores continuam a ser pessoas ‘nossas’, que tratam a D. Lurdes por D. Lurdes ou a D. Conceição por D. Conceição. Dentro das limitações de segurança que todos têm de cumprir, o tratamento não se tornou impessoal”. Quanto aos idosos, ainda que exprimam a falta que esse tipo de interações lhes faz, “percebem que a situação é excecional”. 

Família só do outro lado do ecrã

A 12 de março, o Governo suspendeu as visitas em lares de todo o país, mas para quem, como os utentes do Lar de São José, está a viver uma experiência de isolamento, agravada pelo clima de ansiedade que as circunstâncias recentes têm ajudado a cultivar, é fundamental insistir no regular contacto com familiares. É o que tem acontecido: “Temos privilegiado contactos por videoconferência, o que muito alegra os idosos. Poder ouvir, mas também ver, os familiares, traz-lhes algum ânimo”, explica o responsável. Neste contexto, a coordenação do Património dos Pobres saúda a Câmara Municipal por ter disponibilizado dois equipamentos, um para o Lar, outro para a Residencial Galera, para efetuar estes contactos entre utentes e famílias.

“Apoio da comunidade tem sido fantástico”

Paulo Edgar reconhece que “a comunidade [ilhavense] tem sido impecável. O carinho que temos recebido tem sido fantástico. [Este apoio expressa-se] em coisas simples, como ir levar um bolo ao Lar”, bem como em “ações de grande envergadura, como angariar dinheiro junto de grupos de amigos ou empresas para ajudar a adquirir equipamentos de proteção individual”.

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