É a partir da sua terra natal, Ílhavo, que Nuno Sacramento vai fazendo aquilo de que mais gosta: vender arte. Sediada na Rua Vasco da Gama, a galeria Nuno Sacramento Arte Contemporânea já representa, neste momento, um total de 15 artistas. 

Em entrevista ao jornal O Ilhavense, Nuno Sacramento fala sobre a sua carreira e sobre o panorama atual do mundo da arte, fortemente marcado pela pandemia de Covid-19. São tempos de mudança e esta galeria ilhavense já começou a adaptar-se.

Fazer carreira no mundo das artes era praticamente inevitável…

Foi algo muito natural. O meu pai tinha uma galeria em Aveiro e eu sempre vivi rodeado de ateliers, de pintores, de escultores e exposições. Era o “meio ambiente” em que vivia. 

Alguma vez chegou a pensar fazer outra coisa, seguir outro rumo?

Quando somos jovens temos muitos sonhos e eu também tive os meus. Cheguei a pensar seguir o ensino desportivo, qualquer coisa ligada ao desporto. Mas a vida fez com que eu começasse a trabalhar com o meu pai aos 20 anos. 

Essa paixão pelo desporto é algo que ainda se mantém?

Sim. É uma das minhas paixões. Pratico crossfit e BTT. Gosto muito de andar de bicicleta. 

E tem um filho campeão de BTT (Tomás Sacramento)…

Acabei por passar este bichinho ao meu filho mais velho, muito por conta das organizações da Rota do Bacalhau, pelo Rotary. Ele acabou por viver muito isso e a verdade é que já ganhou a Taça de Portugal de Ciclocross, está agora numa equipa muito boa e, se não fosse esta pandemia, já estaria a fazer algumas provas lá fora. Já o mais novo é completamente diferente, mais dado à parte intelectual e às artes. 

Pode haver aí um potencial artista?

Isto de se ser artista é muito complicado. Não é com um canudo que se é artista. Tem de lhe correr nas veias, tem de se nascer artista.

Quando é que decidiu abrir a sua própria galeria de arte?

Foi em 2005 que comecei a liderar o meu próprio projeto. O meu pai nessa altura já a querer abrandar mais um pouco, ainda que se mantenha ativo e me ajude em muitos projetos. 

Ílhavo acabou por ser o local escolhido para sediar a galeria Nuno Sacramento Arte Contemporânea. Porquê?

Com a crise de 2008 senti que o tipo de vendas que a galeria fazia não era pelo facto de ter um grande espaço aberto ao público no centro de Aveiro, mas sim pelos contactos que fazemos nas feiras. Os grandes colecionadores nem sequer vinham às inaugurações das exposições e as vendas eram muitas vezes feitas à noite, ao fim de semana. Não fazia sentido manter um espaço tão grande, com uma renda pesada, e viemos para Ílhavo. 

Quem procura arte vem ao nosso encontro e, cada vez mais, o trabalho das galerias passa mais por aí, pelos contactos. Em especial os que resultam das feiras de arte, que acabam por ser as grandes impulsionadoras dos negócios. Resta agora ver como é que as coisas vão ficar com este problema da Covid-19. Pela feira de Madrid, por exemplo, passavam 30 mil pessoas. Agora, as feiras vão ter de ser feitas de outra maneira. Penso que vão acontecer coisas novas. As plataformas digitais vão ter uma preponderância grande e vão crescer. 

A galeria Nuno Sacramento, por exemplo, já lançou uma exposição virtual em colaboração com um dos seus artistas, respondendo às imposições do momento que vivemos…

Temos de nos adaptar. Assim que começámos a sentir os constrangimentos da pandemia, lançámos uma exposição online do artista Diogo Landô e correu muito bem. Tivemos muitas reações de clientes e, neste momento, estamos já a preparar uma segunda exposição virtual. Será para lançar nos primeiros dias de maio, com cerca de 30 peças e estamos a tentar procurar já novas formas de levar a arte até à casa dos nossos clientes. Sendo que, havendo interesse nalguma peça, vai sempre ter de haver contacto para verem a peça ao vivo.

Neste momento de crise, a cultura tem sido um dos setores mais afetados. No que toca às artes, também se nota um forte impacto?

Claro. Tivemos de encerrar as portas da galeria por ordem do Governo. Fomos dos primeiros a encerrar e provavelmente seremos os últimos a reiniciar. Tudo o que são indústrias criativas vai sentir um grande abrandamento. Mesmo que se comecem a levantar as medidas e a caminhar no sentido de retomar a normalidade, a verdade é que as pessoas estão receosas. E não se sentem motivadas para sair para o teatro, para adquirir arte. Vamos ter de nos reinventar, de dar a volta e pensar em novas formas de chegar onde queremos chegar.

Quantos artistas representa neste momento a galeria Nuno Sacramento?

Atualmente, são 15 artistas fixos. Depois, temos alguns “flutuantes”, que são alguns nomes mais sonantes, e em que o nosso trabalho passa por adquirir e vender peças. Os artistas que representamos já implicam um trabalho continuado de promoção e divulgação do seu trabalho, com catálogos e exposições individuais. São artistas que lançámos e promovemos. 

Alguns deles são mesmo vocês que os descobrem…

Sim. Todos os dias temos propostas de jovens artistas a querem trabalhar connosco. Mas, como eu dizia no início, não se é artista porque se fez um curso de belas artes. Tem de haver ali qualquer coisa de especial e uma boa dose de humildade. Quando o artista começa logo a pensar que já é muito bom, depois já não cresce. 

O Nuno Sacramento trabalha mais com jovens artistas…

Sim, é verdade. Quando sentimos que um autor é bom, começamos a trabalhá-lo, a promover entrevistas e a levá-lo a feiras. Depois, muitos acabam por dar o salto, alcançando as grandes galerias de Lisboa ou do Porto, que oferecem o que nós não conseguimos oferecer. Mas eu fico muito feliz com isso. E ainda mais feliz se eles forem para Miami ou Nova Iorque. Fizemos parte desse crescimento e isso é importante. 

Quais são os seus artistas favoritos?

Não vou falar em nomes. Apenas vou dizer que são os artistas que me fazem arrepiar a pele. Quando olho para uma peça e ela bate com muita força. E não é fácil isso acontecer, quando já viu tantas feiras internacionais. Mas há artistas que nos marcam. 

Pensei que ia nomear o André Capote, seu irmão…

O André fez uma licenciatura em artes, depois o mestrado, pinta os seus quadros, mas é mais um professor de artes do que propriamente um artista. E isto também é importante. Há grandes artistas contemporâneos que não são grandes professores e há excelentes professores de arte que não são grandes artistas. O André Capote tem uma magia a ensinar, uma forma muito carinhosa a lidar com essas pessoas, e procurou o seu caminho no ensino. Hoje tem a Academia de Belas Artes de Ílhavo, onde também já está a começar aulas online. 

De qualquer das formas, ele costuma fazer uma exposição anual, com os seus alunos, na galeria Nuno Sacramento. Como é, de repente, estarem os três juntos – o Nuno com o irmão e o pai – a organizar uma exposição?

Uma confusão (risos). Para falar a verdade, a minha galeria só ajuda. A exposição é deles e nós temos muito gosto em acolher essa mostra. 

Também recebemos as exposições que resultam de um projeto recente do meu pai e que passa por promover residências artísticas para artistas cubanos. Recebe dois ou três artistas em simultâneo, durante 15 dias ou três semanas, a Academia de Belas Artes de Ílhavo dá apoio e, depois, o culminar é na galeria, onde fazemos as exposições dos artistas. Disso foi exemplo a exposição das artistas Lianet Martínez e Nana Del Riego, e, antes delas, o Ernesto Rancaño. Há outros projetos para o futuro, mas por ora está tudo em stand by.

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