Como é sabido, a partir de Março e devido ao surto do Covid 19, as escolas fecharam-se. Os alunos começaram a receber, em casa, aulas on line. Muito se tem falado sobre este assunto, sobre a validade e pertinência, ou não, desta forma de ensino. As mais variadas opiniões têm circulado. Alternativas não foram apontadas, mas as dúvidas subsistem.

O Ilhavense foi ao Agrupamento de Escolas de Ílhavo, e conversou com a sua Diretora, Drª Maria da Conceição Canhoto – licenciada em Matemática.

O entusiasmo com que fomos recebidos acompanhou toda a entrevista. Era evidente a vontade de se falar da Escola, no seu todo, e de testemunhar a eficácia e extraordinário empenho na ação desenvolvida. Ação educativa, mas também e, pareceu-nos, sobretudo social.

À Escola não compete apenas ensinar. Tem que formar e preparar para as ocorrências mais diversas da vida. E neste Agrupamento, todos estiveram presentes.

A escola esteve sempre na linha da frente, disse-nos.

-Tínhamos um plano de atividades muito rico e completo que imediatamente teve que ser reestruturado em consonância com o Conselho Pedagógico. Todas as aulas passaram a ser síncronas e assíncronas. As aulas síncronas eram de 30min e as ferramentas assíncronas, planificadas conforme a turma.

Está a referir-se a todos os ciclos de ensino?

– A todos os ciclos de ensino! O pré-escolar e o básico tiveram acesso às aulas pela televisão, no Estudo em Casa, tal como o segundo ciclo, mas sempre com articulação entre os professores e os alunos. No secundário tivemos mais preocupação em que houvesse as aulas síncronas por causa dos alunos que tinham exames. Mais tarde, chegámos a ter aulas presenciais que funcionaram seguindo todas as regras da DGS. As turmas foram divididas e distribuídas pelas duas Escolas.

 Como funcionaram as refeições durante esse período?

– Todas as crianças pertencentes ao escalão A e B tiveram as suas refeições até 30 de Junho. Para o escalão A completamente gratuitas e para o B com um pagamento mínimo. Para além disso, conseguimos distribuir cabazes às famílias com necessidades, de 15 em 15 dias. Foi notório o aumento de famílias a precisarem desse apoio, devido sobretudo ao aumento do desemprego. As crianças não podiam ficar sem comer! Nós continuámos, por isso, a fornecer cabazes.

A Escola foi referenciada como Escola de Acolhimento.

– Sim, é verdade. Fomos Escola de Acolhimento, ou seja, uma escola que estava aberta aos filhos dos profissionais de saúde, de militares, de bombeiros, etc. O pavilhão estava destacado para a proteção civil, para o caso de ser necessário colocar lá pessoal ou viaturas. Mobilizámos um grupo de professores para a eventualidade de, aparecendo crianças, lhes ser garantido o apoio escolar ou o acompanhamento necessários. Igualmente, os nossos assistentes operacionais estiveram sempre disponíveis para receberem qualquer criança que chegava.

Sinto-me orgulhosa pela forma como todos aceitaram estas disposições e se prontificaram a colaborar. Para todos, os meus profundos agradecimentos. A maioria dos pais foi conseguindo gerir a situação, sem precisar de nós.

Houve alguns casos que exigiram apoios especiais?

Somos uma Escola de referência de meninos surdos e de meninos com necessidades educativas especiais. Tivemos a grande preocupação de lhes dar uma resposta eficaz, fornecendo a alguns alunos computadores ou tablets, com a grande ajuda da Câmara e da Junta de Freguesia. As duas entidades têm sido formidáveis no imenso apoio que têm dado ao Agrupamento.

Os alunos de etnia cigana colaboraram também neste esforço conjunto de não deixar ninguém sem escola. Houve professores que iam aos acampamentos levar os trabalhos escolares para serem feitos que, posteriormente, eram devolvidos para correção. Esta dinâmica repetia-se de 15 em 15 dias. Com isto não quero dizer que tenhamos dado resposta a todos. Não, de todo. Houve alguns, principalmente alunos que já estavam em abandono, que, infelizmente, não conseguimos segurar.

Comentou-se muito que os alunos não prestavam atenção às aulas online, que estavam distraídos, que não aproveitavam. Qual é a sua perceção?

Não temos essa perceção, muito pelo contrário, houve momentos em que eles eram capazes de estar mais atentos e houve alunos com uma melhor recuperação do que o esperado. Não quero com isto dizer que as aulas online sejam melhores, nada disso.

Em recolhas de dados, os alunos revelaram que sentem muito a falta da escola e da socialização, do convívio, da proximidade. Aprender à distância não é a mesma coisa. Mas, ainda assim, sentimos que estavam muito concentrados e conformados.

Com os mais pequenos foi mais difícil porque tinham os pais em casa que os acompanhavam também nas aulas. Ora, os pais não são professores e mesmo que o sejam, não podem ser professores dos próprios filhos.

Para os professores, a adaptação foi difícil?

Não, de todo. Fomos a primeira escola do distrito de Aveiro a começar com as vídeo-aulas, no dia 13. Tenho muito que elogiar todos os meus professores pelo esforço desenvolvido para que isso acontecesse.

Talvez porque são um grupo de Professores mais jovens não sentiram dificuldades…

Não é verdade. Somos todos mais ou menos velhos! É certo que beneficiámos da presença e ajuda constante dos mais sabedores na área da informática. Demos imensa formação, esclarecemos dúvidas, enfim foi muito trabalhosos para todos, mas não se olhou a meios para se conseguir o sucesso dos alunos.

Principais preocupações?

Tivemos sempre uma maior preocupação para com os alunos que iriam ser sujeitos a exame. Tentámos minimizar o efeito da pandemia no seu resultado escolar. Acabam por ser o nosso rosto, os que mostram lá fora todo o trabalho que se fez neste Agrupamento.

Quanto ainda à pandemia, penso que fechámos bem o ano. Não houve casos de tumultos, de protestos e também não foi registada nenhuma infeção. Tivemos muito cuidado com isso, cumprimos com todas as normas de segurança e desinfeção, com todo o material sempre fornecido pelo ministério, sem qualquer tipo de problemas. Não houve testes nem necessidade de os fazer. Também não pudemos medir a temperatura corporal, por causa da proteção de dados.

Então a avaliação que faz de tudo é francamente positiva?

Relativamente a professores, alunos, assistentes, pais, todos tentámos dar a volta por cima, numa perspetiva de superação de dificuldades. As entidades exteriores à Escola, Câmara, Junta de Freguesia, Direção Regional também responderam da melhor forma.  

Tenho porém que confessar alguma tristeza por haver outras pessoas que tiveram a veleidade de, em sessão de Câmara, indicarem que a Escola de Acolhimento não funcionou e que a Diretora não quis receber os alunos. Ora, a Escola de Acolhimento funcionou desde a primeira hora e eu tive indicações da Diretora Regional que o horário seria ajustado, mas que não podia ultrapassar o legalmente instituído. Havia que cumprir regras e, isso, nem sempre foi entendido. Houve pessoas ligadas à política local e até a algum órgão do Agrupamento que teceram críticas completamente infundadas. Temos todos que nos respeitar e ser respeitados.

E o próximo ano?

No próximo ano, estamos a preparar tudo para uma reabertura normal, com respeito pelas normas da DGS. Não tenho indicações específicas da tutela. Está prevista a abertura da Escola para 15 de setembro, com toda a normalidade. As turmas terão entre 16 a 18 alunos, o que aliás já acontecia para facilitar a integração dos alunos com dificuldades. Iremos ter mais uma turma de 7º ano.

Vamos começar com as aulas presenciais. Se alguém aparecer infetado, teremos de isolar essa pessoa. Mas…seremos obrigados a aprender a conviver com o vírus, a respeitar as normas, mas a continuar. Desde o primeiro dia da pandemia, eu própria nunca deixei de vir à escola.

Relativamente a transportes?

Continuaremos a utilizar o transporte normal, pois, infelizmente, não temos transportes escolares. Este ano vamos ver como vai correr porque vamos tentar partir tempos, ou seja, os    alunos não sairão todos ao mesmo tempo, nem os intervalos serão simultâneos… Será preciso adaptação de horários.

Estão previstos novos Projetos?

No próximo ano, voltamos a abrir o curso noturno, o EFA. Já será o segundo. Receberemos ainda esta semana uma inspeção do EQAVET com a finalidade de nos ser atribuído o selo de qualidade para os Cursos Profissionais. Estamos a fazer uma cozinha pedagógica para os Cursos Profissionais de Cozinha. Além desse, temos também os Cursos Profissionais de Desporto e GPSI.

Queria ainda ter aberto os Cursos de Socioeconómicas e de Artes, mas não houve inscrições de alunos que o justificassem. Estou rodeada de uma boa equipa de colegas que procura conquistar a comunidade através dos alunos.

Uma escola sem dinheiro não vai a lado nenhum. Este ano, com várias atividades, projetos, movimentações da Direção e muito trabalho à mistura, conseguimos angariar bons fundos para o nosso Agrupamento.

Ranking das escolas, que valor lhe atribui?

Não valorizo, de todo. Quando fazemos um estudo há que avaliar as variáveis introduzidas. Ainda por cima, eu que sou de matemática… Ora tudo depende. Se nós introduzirmos as variáveis corretas, os rankings são corretos. Se eu introduzir as variáveis incorretas, os rankings não nos dizem nada. Há que avaliar o meio social da população escolar, os objetivos das famílias, o poder de compra e de pagamento de apoios extras. E isto, os rankings não medem. Eu considero muito mais a valorização do aluno, o seu sucesso pessoal, profissional, mas dentro daquilo que é a sua realidade e os seus obstáculos a nível social.

Nós temos aqui professores extraordinários que todos os dias lidam com o maior profissionalismo face a enormes dificuldades. Podemos dizer que o sucesso do AGEI, face a esta pandemia, está intrinsecamente ligado com os seus valores de humanismo e trabalho social.

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