O Ilhavense João Santos conquista Prémio Tese Destaque da Universidade de São Paulo, na área das Ciências da Saúde, atribuído pela Pró-Reitoria de Pós-Graduação. Este prémio reconhece o trabalho desenvolvido, enquanto investigador, durante o seu doutoramento duplo entre as Universidades de São Paulo e Aveiro
Nascido em 22 junho de 1991, João Santos estudou na Escola Básica e Secundária de Ílhavo, licenciou-se em Biotecnologia pela Universidade de Aveiro (2012), fez o mestrado na mesma universidade em Biotecnologia ramo Industrial e Ambiental (2014) e Doutoramento em regime de dupla titulação em Engenharia Química – especialização Bioengenharia entre a Universidade de Aveiro e a Universidade de São Paulo (2019).
A sua pesquisa é focada no desenvolvimento e implementação de novas soluções biotecnológicas na indústria farmacêutica e desenvolvimento de processos industriais sustentáveis, com recurso ao uso de solventes alternativos (como líquidos iónicos e solventes eutéticos).
Entrevistado pelo Ilhavense, João Santos explica como surge este prémio na sua vida.
Em traços muito simples em que consiste esta tese de doutoramento?
Durante os quatro anos de Doutoramento, trabalhei essencialmente na pesquisa e desenvolvimento de novos biofármacos melhorados. Os biofármacos ou medicamentos biológicos são obtidos por alguma fonte natural ou processo biotecnológico, ou seja, o princípio ativo do medicamento é produzido industrialmente por microrganismos ou células animais. Neste caso, foi estudado o melhoramento da L-asparaginase, biofármaco usado para o tratamento de um tipo específico de leucemia, a leucemia linfoblástica aguda, que afeta maioritariamente crianças. O estudo focou-se na produção de um novo medicamento melhorado, através de uma técnica chamada de PEGuilação.
As Ciências foram sempre uma área de interesse?
Sim, desde pequeno fui um rapaz curioso e apaixonado pela ciência. Fazendo uma retrospetiva, lembro-me em criança de caçar e identificar insetos no quintal da minha bisavó e de ser um miúdo que fazia muitas perguntas, o “bichinho” da ciência já estava aí. Já nos tempos da escola, as minhas disciplinas preferidas sempre foram a química e a biologia e recordo-me de participar em clubes e competições de ciência.
Porquê esta relação entre a Universidade de Aveiro e a USP?
Efetivamente o Doutoramento foi feito em regime de dupla titulação, ou seja, estive aproximadamente dois anos em cada um dos dois grupos de pesquisa: o Nanobio (USP – Brasil) e o PATh (UA – Portugal). A minha ligação com a Universidade de Aveiro, sobretudo com o Departamento de Química, começou em 2009, onde fui aluno de Licenciatura em Biotecnologia e fiz posteriormente o Mestrado nessa mesma instituição. Para mim, a Universidade de Aveiro e o grupo do PATh representam a casa-mãe, onde tive uma formação de excelência, com ótimos professores/orientadores e um ambiente multicultural enriquecedor. Quanto à Universidade de São Paulo, o primeiro contato que tive foi durante o intercâmbio realizado no mestrado em 2013, na Faculdade de Ciências Farmacêuticas. Esta Universidade é considerada a mais conceituada da América Latina, sendo um polo de conhecimento e inovação em pesquisa científica. Após o Mestrado, a parceria científica fortaleceu-se, culminando na publicação de diversos artigos científicos resultantes desta colaboração entre os dois grupos de pesquisa e surgiu então a oportunidade de realizar o Doutoramento duplo nas duas instituições. Este Doutoramento em regime de dupla titulação não existia, desta forma fui formalmente o primeiro pesquisador de Doutoramento neste regime de programa doutoral, abrindo caminho para futuras cooperações científicas transatlânticas.
E porquê o Brasil?
O meu querido Brasil entrou na minha vida pela música, ao som de Bethânia, Caetano, Ney e Chico. Este universo de canções partiu das cordas do violão tocadas pelo meu pai e pela avó Dina e dos discos de MPB que tocavam no carro. Sem dúvida, que a música foi o primeiro elo de ligação ao país de Vera Cruz. Hoje em dia, pelas tantas aventuras, amizades e momentos que vivi deste lado do Oceano, levo o Brasil em mim, mesmo quando regresso a casa.
Este prémio tem um significado especial?
Este prémio representa um reconhecimento de todo o trabalho efetuado ao longo do meu percurso académico. Aproveito para agradecer publicamente a todos os que me auxiliaram no desenvolvimento da tese de Doutoramento, sobretudo às minhas orientadoras Profª Carlota Rangel Yagui e Profª Sónia Ventura, co-orientador Prof. João A. P. Coutinho, aos grupos Path e Nanobio Lab, aos pesquisadores e instituições que direta e indiretamente contribuíram para este trabalho, e também o apoio financeiro da Fundação para a Ciência e a Tecnologia.
Quanto à implicação no futuro?
Defendo que o desenvolvimento de um país, deve passar pelo investimento em ciência, tecnologia e inovação e deixo um repto para que nos próximos anos se possa verdadeiramente profissionalizar a Ciência, com a extinção progressiva das bolsas de investigação de pós-doutoramento e contratação de mais investigadores doutorados e novos docentes com vínculos laborais estáveis. Agora, mais do que nunca, em plena crise sanitária mundial, provocada pela pandemia de COVID-19, se vê o quão fundamental e prioritária é a ciência, cabendo também a nós, cientistas, investigadores e pesquisadores mostrarmos à sociedade a importância do nosso trabalho.
Este prémio dá-me alento para, a cada dia ser um melhor profissional e continuar a fazer ciência de qualidade, em cooperação e com um impacto positivo para a sociedade.
A viver no Brasil, quais as recordações de Ílhavo que provocam mais saudades?
Trocando a letra do Vinicius de Moraes, no meu caso são “Saudades de Portugal no Brasil” (e são tantas). Mas tentando responder à pergunta, elegia os Verões na praia da Costa Nova.