A Ana sentou-se na borda da cama, olhava uma camisolinha acabada de fazer pelas mãos extremosas da sua sogra, fechou os olhos e recordou como se de um filme se tratasse, da despedida do barco onde o seu homem embarcou. Veio-lhe umas saudades…!

Pelas suas contas a criança nasceria antes do Senhor Jesus, era a primeira viagem do seu Zé e o filho iria encher os corações de ambos que começavam ali a sua nova caminhada para a vida.

Ao tentar levantar-se para esquecer os pensamentos da ausência, deu-lhe uma pontada nas costas e por momentos pensou, chegou a hora, tinha que avisar a sogra, ela naquele momento iria comandar a nau, no alto do seu saber de três filhos, saberia o que fazer.Oh mulher! Não me diga que já não vai comer carneiro da caçoila que estou a preparar para a Festa do Senhor Jesus?

E assim foi, pela madrugada a Ana já tinha nos seus braços o seu filho Hugo, o menino tal e qual eles imaginaram, sim porque para menino tinham nome, para menina nem chegaram a pensar. Às primeiras horas do dia, já a avó cheia de chança estava à porta dos Correios para mandar o telegrama ao seu filho.

Senhora Joaninha, ponha aí o telegrama número 31, já lá temos o rapagão, cheio de saúde, tal e qual a cara chapada do meu filho, até parece que o estou a ver… Benz’ó Deus!

Pela manhã, já quase a rua toda sabia do cachopo, era a novidade do dia.
A Ana embalava o filho como se olha para uma jóia preciosa, fechou os olhos e recordou o olhar desvanecente do afastar do barco barra afora, no dia da saída da primeira viagem ao bacalhau do seu Zé. Aqui começava a riqueza de uma vida…, os filhos. Era bonito o seu filho, umas farripitas de cabelo, uns olhos cheios e cinco réis de gente que não lhe cabiam no coração, agora compreendia a razão pela qual as mães da borda andavam sempre com os filhos atrás, pois na ausência do pai as atenções tinham que ser redobradas, era o seu bem que lhes era confiado aquando das idas dos homens para o mar.

Os sinos da Igreja matriz tocaram para o chamamento, tudo se iria arrumar para a procissão, era a festa maior dedicada aos heróis dos mares da Terra Nova, o Senhor Jesus dos Navegantes, carregado por homens valentes, que no mar nalguma aflição faziam a promessa de o levarem, como agradecimento à prece.

Com o filho enrolado numa mantinha feita aos serões das esperas, lá se puseram ao caminho da Malhada, para aí, longe de algum mau olhado, haveria sempre que se precaver. Verem o Senhor na cruz pregado, e ali pedir para aquele ser pequenino, todos os desejos bons para a vida. Foi carinhoso e dorido, quem dera o pai ali a seu lado, a Ana com os braços cheios, o seu Zé só no pensamento, esta é a vida dos homens e das mulheres dos que andam ao mar.
Parabéns filho.

Bem-Haja

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