Era uma vez…

Contar histórias é uma arte que se mantém viva.

Independentemente de todo o tempo que passe, sejam séculos, anos, dias ou horas, existem momentos que merecem ser recordados, outros que não devem ser esquecidos e tantos ainda por descobrir.

Se é verdade que todas as histórias têm o seu início, também o é que nenhuma tem um fim. Estejam pejadas de amores, ódios, encontros e desencontros, mistérios, segredos, alguns dos quais não nos pertencem, mas que de uma forma retorcida tomam conta da nossa natural curiosidade. Todas devem ser contadas. Só assim garantimos que as pessoas de quem falamos se mantêm vivas para sempre.

Não sei dizer se ser curiosa é uma bênção ou um castigo, no entanto, sei que escrever o que me vai na alma é uma forma de exorcizar os meus próprios fantasmas ao mesmo tempo que relembro quem aqui nasceu, viveu e que de alguma forma deixou o seu cunho.

A verdade é que quando morremos, a nossa vida com todos os seus segredos não parte connosco.

No mês em que se celebra o amor e se fala de São Valentim não podia deixar de relembrar o meu avô Mário Barreto Dias, um homem muito à frente da sua época, um apaixonado pela vida, pela família, pela música. Nasceu em Ílhavo, filho do Capitão António da Fonseca Catarino Dias e de Olívia Barreto de Carvalho Dias. O primogénito dos quatro filhos do casal, assistiu à morte precoce de todos os seus irmãos, António, Manuel e Elvira. Tenho a certeza de que a enorme perda o marcou, porém nunca deixou de ser um optimista, um lutador, um pai de família. Sim, porque também para mim foi mais do que um avô, foi um super pai.

Lembro-me com saudades do homem que era, das partidas que pregava, dos truques de cartas, sentado ao piano, a dedilhar o contrabaixo, o violino, da sua infindável paciência, do orgulho que tinha dele. Do trabalho de escola, que apresentei quando tive de falar de alguém que me inspirava e levei uma foto autografada dele com Orson Welles no já desaparecido café Caleidoscópio no Campo Grande, em Lisboa. Mas recordo principalmente como contava divertido as suas peripécias de miúdo através das ruas desta cidade. Das quais faço questão de vos deixar aqui algumas.

Era Janeiro, com o cortante frio da época, na companhia de alguns amigos decidiu nadar num tanque que existia na casa de um deles, chegados lá, despiram-se, porém, nenhum parecia ter a coragem necessária para o fazer. O meu avô querendo mostrar a sua bravura ofereceu-se para ser o primeiro e lá saltou quebrando uma fina camada de gelo que se formara, perdendo o ar com o choque térmico. Porém, quando os amigos lhe perguntaram se a água estava boa, como não conseguia falar, limitou-se a levantar a mão, levando-a à orelha em sinal de aprovação. Os amigos não hesitaram, mergulhando, desatando aos gritos com ameaças de morte por os ter ludibriado. O meu avô Mário saiu da água tão depressa como entrara, vestindo-se a correr, enquanto se afastava a rir deixando para trás os amigos com as suas ameaças.

De uma outra vez, o meu bisavô foi chamado ao colégio porque o meu avô tinha pintado com estrume um bigode na estátua colocada no pátio principal.

Ou ainda quando levava a um bótico de Ílhavo, que tinha por hábito provar as pomadas, cheirando-as posteriormente um boião com estrume misturado com creme. Escusado será dizer que andou escondido durante o tempo necessário até que o bótico se esquecesse da partida de mau gosto. Sabendo o que sei hoje e sendo uma Gomes, espero sinceramente que o bótico não fosse nenhum deles.

As histórias ficam todas marcadas no meu subconsciente e com elas o meu…

…viveram felizes para sempre!

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