Tenho passado os meus finais de tarde na praia da Barquinha, num pequeno retiro pós-laboral (hoje em dia parece que temos de justificar sempre o nosso ócio), onde um amigo vai medindo, pela distância que separa o sol das copas das árvores no horizonte, o pouco que falta para terminar o verão. O tempo não nos poupa, nem no descanso.

A ansiedade é a grande doença deste século e o tempo a mercadoria mais bem cotada – isto não será notícia para ninguém. A chamada “economia da atenção”, coloca as plataformas de streaming como a Netflix a competir contra as nossas horas de sono, e as olheiras com que escrevo este texto por me ter deitado tão tarde ontem à noite a ver pela 4ª ou 5ª vez o Condenados de Shawshank não me deixam mentir. Mas é como diz o protagonista desse tremendo filme: get busy living or get busy diyng, que é como quem diz, apressa-te a viver ou vai dar uma volta. 

Para nos agarramos à primeira oração desse dilema, acredito piamente numa frase que li há tempos, atribuída  a Simone Weil, para definir esse nebuloso conceito que é a “cultura”: “a cultura é a educação da atenção”. O tempo de ciclos noticiosos de 24h por dia, de multi-tasking e de binge watching exige de nós essa aprendizagem, essa capacidade de atentar naquilo que é realmente valioso para vivermos bem.

Quando penso nas restrições que a periodicidade quinzenal deste jornal nos oferece, dou um passo atrás para concluir como o facto de termos de negociar o tempo de todas estas urgências e solicitações é na verdade uma excelente forma de educarmos a nossa atenção .

Como é, no destaque de hoje, olhar para o trabalho dos vários artistas que figuraram a Costa Nova ao longo dos anos, ou do Capitão Marques da Silva na construção dos seus modelos, e ver que estas obras, mais do que a realidade que pretenderam representar, fixam acima de tudo a atenção que lhe dedicaram. Vamo-nos educando com estes e outros exemplos. 

Sabendo, é certo, que a nossa atenção tenderá a cair não muito longe dos locais que frequentamos, e fazendo um esforço para equilibrar esse viés. Por exemplo, na Barquinha, amigos muito atentos a esse lugar vão-me encomendando diversas chamadas de atenção, encomendas para as quais não tenho mãos, que imagino que se multipliquem por todo o concelho, sendo as de cada um sempre as da mais alta urgência, como não é de estranhar. 

Uma delas é a construção de uma pequena escada em madeira para acesso à água, que permita maior conforto e segurança aos banhistas daquele lugar, algo muito simples e barato, dizem-me. Eu, que vou sendo parte interessada, declaro já aqui o meu viés, mas tenho de ir entregando estas encomendas que aqui vou amontoando. Esta fica já entregue.

DEIXE UMA RESPOSTA

Please enter your comment!
Please enter your name here